Ministro da Saúde quer fábrica de derivado de sangue em reduto eleitoral

O Ministério Público junto ao TCU (Tribunal de Contas da União) irá avaliar uma proposta em negociação no Ministério da Saúde que envolve a instalação de uma fábrica de derivados do sangue – os chamados hemoderivados – em Maringá, reduto eleitoral do titular da pasta, Ricardo Barros.

Segundo o ministro, que coordena diretamente as negociações, a ideia é “tentar uma solução global” para resolver o problema de fornecimento desses produtos no país, usados no tratamento de doenças como a hemofilia.

O projeto prevê a formação de um consórcio entre o laboratório Tecpar (Instituto de Tecnologia do Paraná), responsável pela fábrica em Maringá, o Instituto Butantan e a Hemobrás (Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia), em parceria com a empresa suíça Octapharma.

Pelo modelo, as empresas dividiriam a fabricação de hemoderivados para fornecimento ao mercado nacional e exterior. A proposta foi revelada pelo jornal “O Estado de S.Paulo”, e confirmada pela reportagem.

A nova negociação, porém, tem gerado dúvidas entre representantes dos órgãos de controle, que temem prejuízos à União com o fim dos atuais contratos da Hemobrás, que até então adquiria parte dos produtos por meio de transferência de tecnologia de outras duas empresas do exterior.

Soma-se ao impasse o fato de que a construção de uma fábrica da Hemobrás em Goiana (PE), iniciada em 2010 para permitir a produção desses produtos no país, ainda não foi concluída.

O procurador do Ministério Público junto ao TCU, Marinus Marsico, enviou um pedido de esclarecimentos ao Ministério da Saúde sobre a situação da Hemobrás e a proposta do novo consórcio.

“Queremos saber porque está ocorrendo isso, se [o consórcio] é mais econômico do que a solução que foi contratada, e se pode gerar indenizações. Esse contrato [da Hemobrás] terá que ser rescindido e isso pode gerar custos à União”, afirma.

Outra preocupação ocorre em relação ao modelo de contrato e parceria com a Octapharma. A empresa, citada no escândalo da Máfia dos Vampiros, de 2004, foi condenada pelo Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) em 2016 por formação de cartel na venda de hemoderivados ao Ministério da Saúde.

Questionado sobre o caso, o Ministério da Saúde afirma que “eventual parceria da Octopharma deverá ser feita obedecendo a todos os preceitos legais pertinentes, inclusive com as salvaguardas em relação à possibilidade de descumprimento da parceria”.

Caso o acordo seja concretizado, a previsão é que a Octapharma invista US$ 500 milhões na produção de hemoderivados no Brasil – desse total, US$ 250 milhões seriam destinados à construção da fábrica do Tecpar em Maringá, US$ 200 milhões para adequação da fábrica da Hemobrás e US$ 50 milhões ao Butantan.

Em contrapartida, a Octapharma teria o monopólio da venda dos produtos no mercado nacional até que sejam completadas todas as etapas do acordo de transferência de tecnologia.

O prazo para isso ocorrer, porém, não está claro. Em geral, acordos de transferência de tecnologia duram cerca de dez anos. O modelo em estudo no Ministério da Saúde, porém, prevê que o contrato com a Octapharma dure até 25 anos.

Outro ponto em discussão é a divisão da produção pelas empresas. Segundo o Ministério da Saúde, a ideia é produzir, principalmente, hemoderivados como a imunoglobulina, albumina e os fatores recombinantes 8 e 9.

Pela divisão em estudo, a ideia é deixar a produção dos fatores recombinantes para o Tecpar e os demais hemoderivados para as outras duas empresas. Os recombinantes, porém, são considerado mais caros.

Segundo o diretor-presidente do Tecpar, Júlio Félix, a divisão ocorre devido ao fato das outras duas empresas já terem projetos para produção dos demais produtos -a Hemobrás, porém, também teria a do fator 8. “Queremos somar as competências. Não importa quem faz o quê, porque o resultado é divido entre os três”, diz.

O ministro, porém, admite que, embora “sócias em iguais condições”, a divisão dos recursos pode ser feita de acordo com a “cota” de cada uma das empresas no consórcio.

Segundo Barros, o fim dos contratos atuais de transferência de tecnologia da Hemobrás ocorre devido à falta de recursos orçamentários para conclusão da fábrica da Hemobrás em Goiana (PE). “Como não temos esse recurso, comecei a buscar parceiros privados. E apareceu o Tecpar com essa proposta [com a Octapharma]”.

Questionado sobre a escolha de fazer a fábrica em Maringá, o ministro diz que a empresa já tinha o terreno, doado pela prefeitura há quatro anos.

Em nota, a Hemobrás afirma que “está disponível a discutir alternativas que visem a consolidação da Política Nacional do Sangue e se traduza em benefício no tratamento de doenças e coagulopatias”. A empresa diz ainda que trabalha no encerramento de um inventário para que possa dar continuidade ao restante da obra em Goiana (PE). O prazo para finalização é 2019.

Já o Instituto Butantan informou que “tem uma fábrica de hemoderivados pronta, equipada, aguardando um parceiro para iniciar a produção”. Sobre o consórcio, afirma que ainda não recebeu “nenhuma proposta efetiva do Ministério da Saúde.

Fonte: Folha de Pernambuco

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