Sindicatos se reinventam, a regra agora é enxugar custos e racionalizar receitas

Desde que a reforma trabalhista entrou em vigor, em novembro do ano passado, determinando o fim da contribuição sindical obrigatória, a vida dos sindicatos, federações, confederações e centrais de trabalhadores não foi mais a mesma. E quando o Supremo Tribunal Federal concluiu, há dois meses, que é constitucional a extinção do desconto obrigatório no salário dos trabalhadores, percebeu-se que este é um caminho sem volta. A regra entre os sindicalistas agora é enxugar custos, racionalizar receitas e criar novas fontes de renda para compensar as perdas, que não são poucas.

Segundo dados do Ministério do Trabalho, os sindicatos de trabalhadores arrecadaram em maio do ano passado R$ 1,3 bilhão. Um ano depois, já com a reforma em vigor, a captação de recursos foi reduzida para cerca de R$ 118 milhões. Quase 90% a menos. As centrais sindicais, que reúnem sindicatos e federações, também sofreram o baque. A arrecadação caiu de R$ 192 milhões para R$ 17,5 milhões, comparando maio de 2017 com maio de 2018. Restaram cerca de 10% do total. Os sindicatos patronais também viram os recursos minguarem de R$ 530 milhões (maio de 2017) para R$ 139 milhões (maio de 2018), ainda segundo o MT.

O presidente da Central Única de Trabalhadores em Pernambuco (CUT-PE), Paulo Rocha, admite o baque, mas prefere minimizar os efeitos da queda brusca na arrecadação. Para ele, o fim do imposto sindical compulsório foi o aspecto mais leve da reforma trabalhista, mas, no imaginário da população, foi o mais forte. “Já havia a ideia de que os sindicatos só se interessam por dinheiro e não fazem nada e, sem esse dinheiro, o sindicato acaba, o que não é verdade”, diz. Paulo afirma que algumas entidades não sofreram grandes perdas. Ele cita o exemplo dos sindicatos de servidores públicos federais, estaduais, e boa parte dos municipais. “Nesses sindicatos é comum a existência da contribuição espontânea. Muitos associados já optaram pela contribuição mensal que, ao nosso ver, é a ideal, mais do que o imposto sindical obrigatório.” Os mais afetados, na visão de Paulo Rocha, foram os sindicatos ligados às empresas privadas, em que, diz, muitos empregados se sentem desconfortáveis em autorizar o desconto mensal de contribuição, que fica entre 0,5% e 1% do salário, dependendo do estatuto. “Alguns trabalhadores relatam perseguição dos empregadores a quem se filia com desconto em folha”, afirma Rocha.

O líder da CUT afirma que deveria ter havido um tempo de transição para o fim do imposto. “Nós defendíamos a criação de uma taxa negocial, um percentual definido em assembleia por êxito em campanhas salariais. Mas não, o imposto foi cortado sem nada que o substituísse.” Paulo reforça que os sindicatos não vão acabar, mas muitos terão que se adequar a esta nova realidade, focando no convencimento de suas categorias à filiação e à contribuição espontânea. A CUT-PE reúne 200 sindicatos laborais em todo o Estado.

Para Suzineide Rodrigues, presidente do Sindicato dos Bancários de Pernambuco, o revés era esperado. A entidade que comanda vinha se preparando a três anos, desde que os rumores da reforma trabalhista apareceram. Ela conta que o sindicato perdeu cerca de 800 sócios só com as demissões voluntárias do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal. Juntando com o fim do imposto sindical, são quase R$ 1,3 milhão a menos por ano, cerca de 30% da receita. “Estamos fechando contas ainda, cogitando a colocação de imóveis para alugar e talvez instituindo a cobrança de taxas para bancários não contribuintes terem acesso a alguns serviços”, reflete Suzineide. Hoje, o Sindicato dos Bancários de Pernambuco agrega oito mil associados.

O Sindicato dos Médicos de Pernambuco (Simepe) investiu em atrativos para convencer os associados a se manterem ativos, numa espécie de clube de fidelidade sindical. O programa de benefícios foi ampliado e agora oferece desde descontos em ingressos de salas VIP de cinema a planos de saúde com mensalidade até 25% mais em conta. O secretário geral do Simepe, Fernando Cabral, diz que não há outro remédio. O sindicato sobrevive de contribuição sindical e, com o fim do imposto, foi preciso reduzir despesas e buscar mais associados. “Não cogitamos demitir funcionários nem vender ativos, mas, por exemplo, as tradicionais festas organizadas pelo sindicato, como a do Dia do Médico e o Carnaval, hoje têm um orçamento menor. Shows como os de Titãs e Lulu Santos foram substituídos por atrações locais”, explica. Outra providência foi criar o que Cabral chama de equipe de captação. Funcionários que têm a missão de convencer médicos, sobretudo os jovens que estão iniciando na profissão, sobre as vantagens de se sindicalizar. Hoje o Simepe tem cerca de 6.500 associados. Cabral ressalta que serviços como apoio jurídico foram mantidos para os afiliados, mas apenas para os contribuintes. “Não existe a figura do associado não contribuinte”, explica.

PATRONAIS

Do lado dos patrões, também está sendo necessário se reinventar. O assessor da presidência da Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco (Fiepe), Maurício Laranjeira, diz que a entidade não foi pega de surpresa. “Nos preparamos para esta possível queda de arrecadação passando a gerenciar melhor os recursos e, principalmente, oferecendo mais serviços aos sindicatos associados, como cursos, treinamentos, educação executiva e participação em feiras de negócios. O resultado é que a receita até cresceu nos últimos anos”, diz Laranjeira, sem, no entanto, revelar números. A Fiepe representa 34 sindicatos de setores como indústrias de gesso e cimento, metal-mecânica e de bebidas, além de agregar parte do chamado Sistema “S” (Sesi; Senai; Instituto Euvaldo Lodi – IEL; e Centro das Indústrias de Pernambuco – Ciepe).

A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo de Pernambuco (Fecomércio-PE) representa 20 sindicatos associados, desde o de ambulantes e lojistas ao sindicato das farmácias. Através de sua assessoria, informou que não iria comentar sobre dados de arrecadação, mas, no site da entidade, há uma nota que reforça o compromisso dos empresários com a federação: “A Contribuição Sindical Patronal é imprescindível e de extrema importância para o fortalecimento da representatividade do setor. Pagando em dia, o empresário colabora também para a sustentabilidade das entidades sindicais, Federações e Confederação ligada ao seu segmento”, diz o texto.

O economista e professor da UFPE, Tarcísio Araújo, diz que o fim do imposto obrigatório é benéfico porque estabelece uma modernização das relações trabalhistas. “O sindicalismo brasileiro é do tempo de Getúlio Vargas e estava bastante acostumado às benesses do Estado. Essas benesses são, na verdade, a raiz do peleguismo sindical”. O professor se refere à prática de líderes sindicais que mediavam interesses do governo junto aos trabalhadores. Para o economista, este é o momento dos sindicatos evoluírem e servirem de fato aos seus associados, estimulando o sentimento de representação. “O sindicalismo brasileiro precisa de uma renovação. Qual país do mundo tem 17 mil sindicatos, como o Brasil?”, reflete.

Fonte: PE Notícias

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